sexta-feira, 22 de março de 2024

O Brasil não é para amadores

Ray Cunha e seu livro TRÓPICO: thrillers políticos de tirar o fôlego

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 22 DE MARÇO DE 2024 – TRÓPICO (Clube de Autores/Amazon, 229 páginas, 2024), deste escriba, reúne 38 contos, alguns já publicados, mas outros inéditos, como o que abre e dá título ao livro. 

A maioria desses contos são thrillers políticos. Da mesma forma que alguns dos meus trabalhos, inclusive romances, misturo personagens de ficção e tramas inventadas com pessoas, vivas ou mortas, e acontecimentos reais, como o fez Rubem Fonseca no seu romance Agosto, e como fazem inúmeros escritores. 

Em TRÓPICO, o que há de real é a ambientação sufocante de uma pergunta sem resposta: quem mandou matar Bolsonaro? Quero deixar claro que essa pergunta não é minha, mas pública, e que TRÓPICO é apenas uma história fictícia, como 1984, de George Orwell. Segue o conto. 

LUCAS Miguel Benítez Loyola. Lucas, em homenagem ao pai; Miguel, ao avô paterno; Benítez, sobrenome paterno da sua mãe; e Loyola, sobrenome paterno do seu pai, paraense de Belém, e que desde que fora fazer faculdade no Rio sempre morou em Copacabana, Rio de Janeiro. Lucas pai era neurocirurgião. Conheceu sua esposa, a bela psicóloga catalã Andreza Isabel Navarro Benítez, durante encontro internacional de psiquiatria e psicologia no Copacabana Palace. Casaram-se e viajaram imediatamente para a cidade natal de Isabel, Barcelona, a imperatriz do Mediterrâneo, onde sua família descendia de uma linhagem de mestres em Medicina Tradicional Chinesa. Não deu outra, Lucas pai conheceu o Instituto Superior de Medicinas Tradicionais (Ismet), onde se especializou em medicina chinesa. Brilhante, aprendeu mandarim com facilidade espantosa e mergulhou nos clássicos da milenar ciência, bem como no taoísmo e no zen-budismo, e procurou transmitir ao filho a essência de tudo o que aprendera.

Lucas nasceu em 20 de julho de 1969, ao lado do Copacabana Palace Hotel, no apartamento da família, no sétimo andar do Edifício Chopin. Nasceu no mesmo momento em que os astronautas Neil Armstrong e Buzz Aldrin alunissavam o módulo lunar Eagle. Dezessete anos depois, em 1986, o médium Chico Xavier conversava com o escritor e editor Geraldo Lemos Neto e a médica Marlene Nobre quando falou a respeito do que Geraldo Lemos chamou de Data-Limite, moratória de 50 anos (20 de julho de 1969 a 20 de julho de 2019) que o Comando Planetário do Sol dava para a Humanidade. Se nesse intervalo não fosse deflagrada a Terceira Guerra Mundial, a Humanidade entraria em uma era de amor, paz, luz e prosperidade. Em caso de uma guerra atômica, poucas regiões do planeta escapariam do armagedom, uma série de cataclismos que se sucederiam a explosões nucleares. O Brasil seria uma região abençoada, onde se abrigaria a maior parte da Humanidade, especialmente os habitantes do Hemisfério Norte, que seria arrasado. Assim, pensou Lucas, considerando-se que a ameaça de uma guerra nuclear no intervalo da Data Limite já é passado, a era da luz já começou, e os avatares que trarão a boa-nova, seres de civilizações muito mais avançadas do que a terráquea, começaram, aos poucos, a se apresentar para a raça humana.

Lucas tinha dois grandes amigos de infância: Luiz Cabral Maia Júnior e Octávio de Oliveira Noblat. Ingressaram juntos na Universidade Federal do Rio de Janeiro; Luiz Cabral Júnior no curso de Direito, Octávio de Oliveira Noblat no de Jornalismo e Lucas no de Medicina, o qual abandonou um ano depois, fez novo vestibular e entrou no curso de Jornalismo, formando-se um ano depois de Noblat, como Octávio era conhecido. A mudança se deu pelo seguinte: ainda no primeiro ano de Medicina, mas conversando com alunos do último ano e com residentes, Lucas observou, consternado, que o aprendizado da ciência médica requeria experiências e treinamento com cobaias, e Lucas percebeu que as cobaias sofriam com os protocolos a que eram submetidas. Observou também que, embora supervisionados pelos professores, alunos sem o menor talento para procedimentos médicos submetiam pacientes carentes a sofrimento e a perigo inclusive de vir a óbito. Ao fazer essa investigação, que surgira de conversas com colegas seus, a coisa, para ele, ficou insustentável. Então se dedicou, durante um mês, a coletar dados e provas sobre o que chamou de corredor da morte, após o que escreveu longo artigo sobre o assunto e o enviou para o jornal O Globo, que o publicou. Foi aí que descobriu que se não tinha talento para a Medicina, tinha-o para o Jornalismo.

Noblat vinha de uma família que praticava tai-chi chuan, rompeu com essa tradição e, ainda rapazola, começou a treinar kendo, e convenceu Lucas e Luiz Cabral a treinarem também. Um mês depois, Luiz Cabral desistiu; quanto a Lucas, sentiu que tinha habilidades insuspeitas com a katana. Noblat se dedicava de corpo e alma ao kendo, mas Lucas descobriu que ele cometia um pecado capital: a vaidade. Noblat treinava muito, e Lucas descobriu que Noblat treinava inclusive secretamente apenas para exibir suas habilidades nos embates com Lucas.

Foi nessa época, aos 18 anos, que houve uma reviravolta na vida de Lucas. Ele soube que havia um mosteiro Shaolin em Limeira/SP, e, nas férias de fim de ano, viajou para lá.

O famoso Templo Shaolin foi construído em 495, pelo imperador Xiaowen, da dinastia Wei do Norte (386-557), para abrigar o mestre indiano Batuo Buddhabhadra, primeiro abade do mosteiro. Em 520, o mosteiro abrigou o monge indiano Bodhidharma, também conhecido como Ta Mo, em chinês, e Daruma Taishi, em japonês, vigésimo oitavo patriarca budista e primeiro patriarca zen-budista, que criou o estilo chan (zen) do budismo e o estilo shaolin de kung fu. Para fortalecer os monges, fisicamente debilitados com tanta meditação, Bodidarma impôs um exaustivo treinamento físico, o que se tornaria a arte marcial do kung fu shaolin, além de exercícios de paciência e humildade, e técnicas de meditação, que os levariam a desenvolver o verdadeiro poder: o da mente. Em 1733, os Manchus, que haviam invadido a China, destruíram o templo. Mas sobreviveram cinco mestres e quinze discípulos, que se espalharam e começaram a treinar secretamente alguns eleitos. Nesse meio tempo, o mosteiro foi destruído e reconstruído várias vezes, mas funciona até hoje, embora se constitua em uma pálida lembrança do que foi. Em 2000, o abade Shi Yongxin autorizou a abertura de filiais do mosteiro fora da China.

Durante dois meses, todos os dias, Lucas se dedicou a um treinamento até o desmaio para desenvolver sua resistência e habilidade, a ponto de ser capaz de atingir com a espada uma abelha em pleno voo. De volta à Copacabana, viu, logo no primeiro encontro com Noblat, que ele se tornava cada vez mais fanfarrão, gabando-se da sua evolução no kendo e no tiro ao alvo, no qual, realmente, demonstrava rapidez e pontaria inacreditáveis.

Durante a década de 1990, Lucas e Noblat estagiaram em O Globo e foram contratados pelo jornal, e depois pela revista Veja Rio. Quanto a Luiz Cabral Júnior, foi efetivado em uma banca especializada na defesa de políticos. Seu pai, o clínico geral Luiz Cabral Maia, velho amigo de Lucas pai, se elegeu senador, em 1998; no ano seguinte, Luiz Cabral Júnior seguiu para Brasília, para assumir a chefia de gabinete do pai, e Noblat, a assessoria de imprensa do senador. Lucas, que tinha então 29 anos, foi apresentado, durante première no Copacabana Palace, à deslumbrante atriz acriana de origem holandesa Brigitte Van Dijk Nassau. Estrela dos filmes Filhinha do papai e O que fazer para prender minha esposa?, do cineasta carioca Arlindo Ipanema, ela agora brilhava no seu novo filme: A garotinha cresce, da cineasta também carioca Luciana Magalhães. Dormiram juntos, naquela noite, no próprio Copacabana, e, dois dias depois, embarcaram para Belém, onde tomaram um navio para Manaus, e, de lá, foram de avião para Rio Branco. Passaram dois meses na Amazônia, ao fim do que retornaram para o Rio de Janeiro e se casaram. Um ano depois, nasceu Andreza Isabel Nassau Loyola. E foi aí que a coisa desandou. Brigitte teve um caso com Arlindo Ipanema e engravidou dele. Lucas pediu divórcio e se separaram, e ficou com a guarda de Andreza. No início de 2000, Brigitte entrou em trabalho de parto para ter o bebê de Arlindo Ipanema quando a tragédia aconteceu: ela e a criança morreram por complicações durante o parto. O bebê morreu estrangulado pelo próprio cordão umbilical e ela, de hemorragia. Assim, a pequena Andreza foi criada, desde bebê, pela avó. Mas Lucas se tornou amicíssimo de um tio de Brigitte, Maurício Nassau, especializado em informática nos Estados Unidos, com experiência no Vale do Silício e no setor de inteligência do governo federal brasileiro.

Foi também nessa época que Isabel Navarro Benítez descobriu que seu marido tinha uma amante e resolveu retornar de vez para Barcelona, levando a neta. Assim que partiu, a amante de Lucas pai morreu atropelada. Foi quando o senador Luiz Cabral Maia o convidou para assumir a direção do Hospital Juscelino Kubitscheck, que adquirira após um ano de mandato, e, a Lucas filho, ofereceu o cargo de assessor de imprensa, trabalhando com seus dois amigos de infância: Luiz Cabral filho e Noblat.

Em 2006, Luiz Cabral pai se reelegeu, mas Lucas caiu fora do seu gabinete; o senador estava atolado no Mensalão, monumental esquema de compra de votos de parlamentares no Congresso Nacional. Nesse meio tempo, Lucas começou a trabalhar no Correio Braziliense e, depois, na Trópico – Revista Geopolítica, editada por uma das jornalistas mais brilhantes de Brasília: Natacha Fabre Tahan, que fazia mestrado em política internacional nos Estados Unidos. Quando terminou a pós-graduação, retornou para Brasília. Era filha do pioneiro e magnata da construção civil, o judeu-russo Vladimir Tahan, e da francesa Catherine Fabre, que vieram para Brasília a convite de Juscelino Kubitscheck e fizeram fortuna. Ao retornar à cidade, em 2004, casou-se com o pintor gaúcho radicado em Brasília, André Bellinazo, e logo depois fundou a Trópico – Revista Geopolítica. Lucas a conhecera no gabinete do senador Luiz Cabral Maia. Ela ia lá atrás de informações e costumavam almoçar juntos. Logo que Lucas saiu da assessoria de imprensa e foi para o jornal Correio Braziliense, como redator, escreveu uma série de artigos geopolíticos sobre o Brasil, especialmente sobre a Amazônia, por quem era apaixonado, desde que fora conhecer a família do seu pai, espalhada em Belém e Manaus, e a de Brigitte, em Rio Branco. Em 2011, aconteceram duas coisas importantes na vida de Lucas: seu pai faleceu e Lucas se sentiu miseravelmente só, pensando em passar um tempo em Barcelona, mas, poucos dias depois da morte de Lucas pai, Natacha Tahan o convidou para assumir a subeditoria da revista. Ele aceitou. Um dia, naquele ano, ficaram enrolando até tarde na revista, até que ela resolveu tomar a iniciativa. Foram para o apartamento de Lucas e passaram o restante da noite trabalhando, mas em outra ordem de atividade. Entre Natacha e seu marido, André Bellinazo, não havia segredos, nem tabus. Assim, Natacha comunicou a Lucas que André Bellinazo achou natural que ela tivesse um amante, que achava Lucas um cara bacana e até deu a entender que se Natacha quisesse ela poderia ir para a cama com os dois, o que Lucas descartou imediatamente.

Quanto ao senador Luiz Cabral Maia, tornou-se, em 2019, presidente da Mobilização Nacional (Mona), partido ao qual Lucas chamava de Magos Negros.

Assim, o apartamento em Copacabana fora vendido e comprado outro no Sudoeste, bairro no Plano Piloto de Brasília, na Quadra 102, Bloco H, Edifício Le Triumph, onde Lucas morava desde março de 2000, quando o prédio foi inaugurado, e para o qual se mudara juntamente com seu pai. Gostava do bairro, Setor de Habitações Coletivas Sudoeste (SHCSW), ou, simplesmente, Sudoeste, criado em 10 de julho de 1989, quando o urbanista Lúcio Costa assinou o Projeto Brasília Revisitada. Em 1993, começaram a surgir os primeiros prédios residenciais e comerciais e os primeiros moradores se mudaram para lá. Logo no início, o bairro era conhecido como Sudalama, pois quando chovia um rio de lama escorria do Sudoeste para o Parque da Cidade Sarah Kubitschek, ao sul, cobrindo a Estrada-Parque Indústrias Gráficas (Epig), que separa o Sudoeste do Parque da Cidade, mas, pouco tempo depois, o Sudoeste se tornou um dos metros quadrados mais caros do país.

O Le Triumph se localiza quase de frente ao centro hípico do Parque da Cidade, cruzando-se a Epig. No outro lado do prédio há uma pracinha. Lucas desceu e tomou a calçada entre a pracinha e o Bloco J, Edifício Fênix, e se dirigiu a Pães e Vinhos. Era outono, início de maio, e a ordem era só sair de casa quando absolutamente necessário, e de máscara, por causa da pandemia de coronavírus.

Logo no início de 2019, o senador Luiz Cabral Maia começou a bater ponto no Palácio do Planalto, levando consigo, sempre que ia lá, uma saca de confete.

            De volta ao apartamento, enquanto degustava pão com manteiga e café com leite, Lucas repassava a conversa que tivera com Natacha, à noite, na revista, situada no estratégico Brasil 21, no Setor Hoteleiro Sul (SHS). A Trópico ocupava um conjunto de salas na Business Center Tower, com vista para a Torre de TV, no Eixo Monumental.

             – Observei que você vem conversando muito com a Clarice; tem alguma coisa a ver com essa investigação?

            Clarice Melo trabalhava há um ano e meio na revista. Tinha 27 anos. Lucas instruiu-a a colar no senador e em Noblat.

            – Sim! Ela também está perto de encontrar provas irrefutáveis do plano do senador.

            Em torno das 10 horas, Lucas foi até a cozinha e pegou uma goiaba. Depois, ligou para seu velho amigo Maurício Nassau, tio de Brigitte, da Total Segurança. Maurício era um gênio, um hacker talentoso. Trabalhou na Agência Brasileira de Informações (Abin), de 1969 até dezembro de 2003, ao fim do que se desligou da instituição. Percebera, ao longo de 2003, que mudanças profundas começaram a ocorrer no país, e que seria mais útil, como patriota, trabalhar para a banda boa das instituições brasileiras. Maurício tratava Lucas como a um filho.

            – Maurício, você tem que descobrir onde fica o supercomputador do senador, ainda hoje! – disse Lucas, em um tom meio desesperado.

            – Vou descobrir.

            Assim que Lucas desligou o celular o aparelho tocou novamente. Atendeu. Ficou pálido. Desligou o aparelho. Trocou de roupa às pressas e desceu do apartamento, tomou pelo caminho, ao lado do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, entre as Quadras 103 e 104, e saiu na Epig, cruzou-a e entrou no Parque da Cidade, tomou a calçada atrás do restaurante Gibão Carne de Sol rumo ao Bosque dos Pinheiros, entre o Gibão e o Alpinus Choperia e Galeteria. A certa altura viu, ainda longe, o movimento dos policiais. Quando se aproximou, o delegado Baruch, titular da Terceira DP, do Cruzeiro Velho, se aproximou dele. Lucas viu que também o delegado Larroyed, da Coordenação de Repressão a Homicídios e de Proteção à Pessoa (CHPP), estava lá, esperando-o. Conhecia os dois, pois acompanhara o sequestro e assassinato de uma menor no Sudoeste, crime solucionado pelos dois delegados.           O local fora isolado por fitas, onde algumas pessoas trabalhavam em torno de um corpo e de uma cabeça, a cerca de três metros do corpo. Os olhos estavam arregalados e pareciam olhar para todos. Era a cabeça da repórter da Trópico: Clarice Melo.

            – Ela foi degolada com uma katana – Lucas balbuciou.

            – Katana? – perguntaram, simultaneamente, os dois delegados.

            – É uma espada japonesa – Lucas respondeu.

            Naquele mesmo dia, devia ser pouco mais de 16 horas, a temperatura no gabinete do delegado Larroyed estava por volta dos 21 graus. A Coordenação de Repressão a Homicídios e de Proteção à Pessoa fica na sede da Polícia Civil do Distrito Federal, localizada distante cerca de 500 metros do local onde foi encontrado o corpo de Clarice, no Parque da Cidade.

            – Noblat tem um álibi perfeito: passou a noite no gabinete do senador Cabral, e a câmera do corredor mostra que a Clarice deixou o gabinete às 21 horas – disse o delegado.

            – O senhor precisa olhar de novo a fita, para ver quem saiu do gabinete depois de Clarice, e, a partir daí, quem entrou. Precisamos ver se a mesma pessoa saiu e entrou das 21 horas até às 10 horas de hoje – Lucas observou. – E também precisamos ver as fitas do prédio onde Noblat mora, na 302 do Sudoeste. Essa, eu sei como conseguir. Trata-se da empresa de um grande amigo meu.

            – Sim, vamos fazer isso! – Larroyed exclamou, sem discutir os métodos de Lucas. – Ainda hoje terei uma cópia da fita. O chefe da segurança do Senado é meu amigo de infância e fizemos faculdade juntos.

Lucas deixou a Coordenação de Repressão a Homicídios e de Proteção à Pessoa em torno das 18 horas. Havia ido para lá de pés. Cruzou a Epig na altura da Quadra 105 do Sudoeste e se dirigiu para a Pães e Vinhos, na 103. Comprou pães, queijo e salgadinhos. Ao sair, deu a volta por trás do bloco e pegou a calçada que liga as quadras. Quando já estava atravessando a rua que separa as Quadras 103 da 102 olhou rapidamente para trás e viu um vulto parado atrás da Pães e Vinhos. Chegou ao calçadão da 103 e tomou por uma entrada paralela à calçada de pedestre, acocorou-se atrás de uma caçamba de entulho e aguardou. Ficou ali durante mais ou menos dois minutos, mas nada aconteceu. Saiu dali e esquadrinhou a paisagem, mas não viu nada suspeito. Então retornou, vagarosamente, para casa. Clarice, a pobre Clarice, descobrira alguma coisa. Os comunistas, brasileiros e internacionais, os bolivarianos, o pessoal do clube do Foro de São Paulo, as máfias, os corruptos, dos mais graduados à raia miúda, tinham recebido um tiro na artéria femoral; por enquanto, estavam estancando o sangue com torniquete, mas cedo ou tarde teriam que dar um jeito definitivo nisso. Estavam perdendo bilhões de reais por dia, por conta da eleição de Jair Messias Bolsonaro à Presidência da República. Ele foi radical: cortou pela raiz qualquer fisiologismo, demitiu, e continuava a demitir, cabides inteiros de emprego, cortou as verbas bilionárias desviadas para a imprensa amestrada e respondia aos repórteres de plantão e aos entrevistadores com a franqueza de um santo. Quando viram que ele ganharia as eleições, mesmo fazendo sua campanha com pouco dinheiro e sem o menor apoio da grande mídia, despacharam um assassino para acabar definitivamente com aquilo, mas Bolsonaro sobreviveu, e ficou ainda mais forte, pois soube, então, que estava jogando com assassinos. Desde que Bolsonaro assumiu o comando do Executivo que a guerra de terra arrasada começou. Os comunistas se armaram até os dentes, e continuariam se armando, e só parariam de atirar quando vissem o capitão exangue, e o explodiriam, ou fariam picadinho dele, ou o incinerariam, ou o jogariam no mar, amarrado e com uma bigorna atada aos pés, ou dariam um jeito de prendê-lo, humilhá-lo e matá-lo aos poucos, fazendo-o comer os próprios bagos. Os comunistas eram capazes de tudo por dinheiro, Lucas sabia disso; eram capazes de matar uma repórter da banda boa da imprensa como quem chuta um cachorro vira-lata que estivesse olhando muito de perto o prato de comida de um sujeito que odeia cães. E o próximo vira-lata poderia ser ele mesmo. Clarice teria feito uma descoberta muito importante. Em algum lugar, um computador armazenaria um planejamento completo de como desestabilizar o governo Bolsonaro, sua defenestração, seu ostracismo, sua humilhação, sua pulverização, mantendo-o vivo só para atirá-lo às hienas. Um jogo totalmente bruto.

A pandemia começou na cidade de Wuhan, no laboratório de pesquisa de vírus mais avançado da China, vinculado ao programa secreto chinês de armas biológicas. Aliás, tudo na China é secreto. Com 9,6 milhões de quilômetros quadrados e mais de 1,5 bilhão de habitantes, seu PIB é de 14 trilhões de dólares, atrás somente do PIB dos Estados Unidos, de 21 trilhões de dólares. E é uma potência nuclear. Um de janeiro de 1912 estabelece o fim da China imperial e o início da República da China. Em 1949, Mao Tsé-Tung funda a República Popular da China, em guerra civil que ceifou dezenas de milhões de chineses, e, já instalada a república popular, matou de fome mais de meia centena de milhões de civis. Em 1978, o então líder da China, Deng Xiaoping, abre uma brecha para a economia de mercado, mas o estado continua totalitário. Jornalistas e pesquisadores dão conta de que a poluição na China mata milhões de pessoas por ano, inclusive nos corredores da morte, onde a roleta russa entre dissidentes do Partido Comunista ou reles criminosos funciona em escala industrial. Esses condenados seriam desmantelados e seus órgãos vendidos no mercado negro. A internet é vigiada, a imprensa é castrada, e fazer filhos e professar uma religião ocidental não é tão simples assim. Os chineses comem basicamente arroz, e qualquer animal, incluindo peçonhentos, ratos e morcegos, cães e gatos. Uma feira chinesa é aterrorizante para um ocidental. É comum encontrar-se nelas o principal pet europeu-americano, o cachorro, aguardando, com olhar triste, em uma jaula, ser abatido ali mesmo. Grandes pandemias começaram na China, como a pior delas, no século 14, a peste bubônica, causada não por vírus, mas por uma bactéria, transmitida ao ser humano por pulga de rato e outros roedores. Em 1343, a peste chegou à Europa pela rota da seda. Estima-se que matou, então, 15% da população mundial, pelo menos 75 milhões de pessoas.

Teriam, os comunistas, criado um vírus capaz de instalar a Nova Ordem Mundial, totalitária? O coronavírus estava matando no mundo inteiro e derrubando a economia mundial, principalmente a dos Estados Unidos. Estaria, então, esse vírus, sendo usado como arma biológica? Se assim fosse, seria uma terceira guerra mundial? Os comunistas, e outras máfias, partindo para o confronte final contra o capitalismo. Supondo-se que os comunistas vencessem, então só a elite teria privilégios; a maioria dos humanos serviria como escrava, inclusive sexual, e para a retirada de órgãos. Mas não seria isso apenas uma dessas teorias delirantes da conspiração?

Contudo, Lucas nunca descartava a questão espiritualista. Partindo do pressuposto de que os débitos de carmas coletivos costumam ser resgatados em tragédias, as pandemias podem ser incluídas nesses resgates, promovendo desencarnes em massa, reunindo grupos de espíritos comprometidos com débitos semelhantes em reencarnações pregressas. Essas calamidades despertam solidariedade e amor. Conforme O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Alan Kardek: “As grandes provas são quase sempre um indício de um fim de sofrimento e de aperfeiçoamento do espírito”. E, no Livro dos Espíritos, também de Allan Kardec, lê-se: “Se um povo não avança bastante rápido, Deus lhe provoca, de tempo em tempos, um abalo físico ou moral que o transforma”. O espírito reencarna onde tem vínculos de amor e de ódio, ou seja, junto aqueles com quem tem fortes laços de amor ou de ódio, de forma que os explorados e exploradores do Brasil colonial para cá estão entre nós, reencarnados ou não, incluindo assassinos, ladrões, aventureiros, exploradores, malandros e vagabundos. Sempre foi assim; a Terra é uma escola. Só o cenário muda. Os que viviam à custa do trabalho escravo, inclusive nos dias de hoje, reencarnarão como um político honesto? Não! Só mudamos quando aprendemos.

            Eram 23 horas quando Lucas desligou o computador. Foi à cozinha, preparou um chá e se refestelou no grande sofá da sala. “As pandemias apavoram a Humanidade desde sempre” – pensou. Ele já sabia que pesquisadores apontam 2020 como um divisor de águas para a Humanidade. Em 2016, os astrólogos Boris Cristoff (1925-2017) previu uma pandemia para 2020; também a brasileira Celisa Beranger e Henri-Joseph Gouchon (1898-1978) e Andre Barbault (1921-2019) declararam que 2020 seria crítico, com mudanças políticas e econômicas radicais em todo o planeta. Mas, a partir de 2023, começaria um período de grande crescimento para a Humanidade.

            Seu celular tocou; era Maurício.

– Descobri o supercomputador. Sabe onde? No gabinete do senador. E encontrei o plano, com tudo lá, todas as informações. Copiei tudo e já te enviei.

– Vou trabalhar na matéria, hoje, a noite toda, e imprimir a revista amanhã, e, claro, despachar também, ainda hoje, todo o material para meu contato na Polícia Federal.

– Ok!

Desligou. Logo a seguir Lucas recebeu outro telefonema. Desta vez de Noblat.

Vestiu-se todo de preto, pegou a Glock e a katana, pôs a máscara e desceu, dirigindo-se para o Parque da Cidade. Entrou pelo portão próximo ao seu prédio e foi diretamente para o local onde o corpo de Clarice foi encontrado. Noblat o aguardava.

– Você sabe que seu fim chegou, não é?

– Sim, pode ser. Mas pode ser o seu também.

– Você passou para o lugar errado e tem que morrer, assim como a sua amiguinha, degolado também. Eu bem que tentei ensiná-lo a manejar a katana, mas você é burro mesmo, e não aprendeu, pelo menos o necessário para esticar um pouco mais a sua vida de traíra!

– Traíra?

– Sim, traíra! Você traiu algo que a vida lhe deu: a boa vida da elite comunista. Fernando Henrique Cardoso mostrou o caminho das pedras, criando o Foro de São Paulo e Lula, e o senador abriu a porta para você, mas você jogou tudo isso fora, seu traidor!

Lucas tirou sua katana do estojo, que parecia uma caixa.

– Ia sugerir que você começasse a rezar, mas você não aprendeu a rezar; aprendeu a usar a katana, mas de forma errada, degolando uma pobre moça, que tudo o que desejava era fazer seu trabalho honestamente.

– Honestamente? Ela descobriu o Estado paralelo que está governando o país, além do que há por trás do vírus chinês, e que o senador é peça importante na nova ordem, idiota! Você não vê que o mundo mudou? – disse Noblat, sacando sua katana. Ele entrara no parque de novo de automóvel, provavelmente passando em um ponto sem vigilância e fechado apenas com cones, devido à quarentena.

– Prefiro pensar como os budistas, que a matéria não existe. Assim, não tenho medo da morte; não sinto medo algum. Estou esperando.

Noblat havia se aproximado um pouco de Lucas, posicionado para atacar. Lucas estava também posicionado, mas inteiramente parado, pois nada se movia nele, e de olhos fechados.

“Esse imbecil está de olhos fechados; não acredito! Não aprendeu nada do que lhe ensinei” – Noblat pensou.

A coisa teve um desfecho muito rápido, nada cinematográfico. Lucas estava ali, concentrado; sentia como se estivesse em um espaço sem tempo, todo o Universo vibrando como um som sem som, e, de repente, explodiu, inesperado como um raio, e uma cabeça foi expelida do pescoço, subiu e caiu no chão, como um coco vazio de água, e rolou para uns cinco metros de distância do corpo, que ainda ficou dois ou três segundos em pé e depois desmoronou. Lucas limpou a katana na roupa de Noblat, guardou-a na caixa e voltou para casa. A quarentena estava rendendo. A noite seria curta para o que tinha a fazer.

quinta-feira, 21 de março de 2024

Outono

Ray Cunha, em foto do outono de 2019, no Sudoeste, Brasília/DF

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 21 DE MARÇO DE 2024 – Os dias amanhecem como fotografias sépias e as mulheres trajam casacos e já não saem de sandálias e roupas que lhes deixam grande parte da sua pele maravilhosa iluminar o planeta. Costuma, agora, fazer 19 graus centígrados em torno das 8 horas, quando, às vezes, atravesso as ruas da manhã, curtindo tudo o que me ofertam. Ao cruzar com uma mulher muito bonita, agradeço a Deus, porque é bom presságio. As manhãs são sempre como as rosas, recendem ao perfume redentor de mulheres que acabaram de sair do banho e presenteiam o mundo com seu esplendor. 

Curto as manhãs de outono como todas as manhãs, da primavera, do verão e do inverno, porque as joias que guardei no meu relicário são feitas dos sons das manhãs, risos de crianças, marulhar longínquo, quem sabe da ilha de Mosqueiro, ou Salinas, ou Copacabana, ou Ipanema. Meu relicário é do tamanho do meu coração, e contém uma cidade inteira, que pode ser Brasília, Belém, Rio de Janeiro, ou Macapá. 

Se Macapá, um vendaval sacode minha alma, porque a simples palavra Macapá me inunda de endorfina. Somos velhos amantes. Macapá é tão azul que mais azul só os poemas da Alcinéa Maria Cavalcante. E ainda mais azul, o primeiro beijo, que me ensinou a voar. O Rio de Janeiro vive no meu relicário como uma portuguesinha da Ilha do Governador ensaiando Miolo de Pão, peça que o meu amigo Luiz Loyola escreveu sobre a família dele e guardou na gaveta mais preciosa. 

Tudo isso me ocorre porque é o último dia do verão. Brasília é como a mulher amada. Vou explorando seus labirintos com paciência e gentileza, na esperança de que ela abra para mim todas as suas portas secretas; de vez em quando descubro minas de diamante e rubi nas suas luzes. 

E se logo no início do outono está tão bom, imagino quando chegarem o inverno, as manhãs de neblina, de cerração, de frentes frias, as noites de ventania, as mulheres lindas, mais misteriosas do que nunca, deixando à mostra apenas suas bocas pintadas de vermelho, o corpo da mulher amada sob o edredom, o levantar-se às 5 horas, o café 3 Corações, gourmet, e o retomar da aventura ao computador. 

Com três xícaras de café com leite em pó e duas fatias de pão com passas a manhã fica ainda mais cintilante, porque já é magnífica por ser outono. Assim, passam-se os dias, como folhas que caem, suavemente, sustentadas pela brisa, até o chão. À noite, no nicho da minha biblioteca, sonho novamente com a manhã, e com a tarde, e com os aromas que senti vindos de planetas que gravitam em volta da minha alma. 

A vida é isto! – penso. Sim, viver é voar, como estou fazendo agora. A vida cabe toda, agora, como imensa rosa vermelha, inexpugnável na sua fragilidade, eterna na sua fugacidade, invencível na sua beleza. Quero ficar grávido da manhã, do outono e das rosas; só assim escreverei palavras azuis como rubis. 

O outono, pois, está lá fora. As noites são frias e os dias nublados. Ando pelo apartamento, aliso a lombada dos livros na estante, olho pela janela e vejo na pracinha defronte ao meu bloco alguém conduzindo dois cachorros, daqueles que parecem tapurus, e logo desaparecem. A manhã volta ao silêncio e à solidão. 

Nos últimos dias de verão chove, às vezes, de madrugada. O quarto é silencioso como um templo. Só ouvimos o pinicar da chuva fina na vidraça. Venta na praça e as árvores defronte ao apartamento curvam-se, agitadas – lembram cabelos de mulher. Levanto-me, vou ao banheiro e depois à cozinha, onde preparo café Três Corações, gourmet, que tomo com leite em pó e um sanduíche de pão francês com queijo prato. Retorno ao quarto. Minha gata já se levantou também. Lemos um sutra e meditamos. Depois, pomo-nos a ver a chuva, ambos que somos de Macapá, a terra das águas. Daí a pouco o som da chuva e do vento se mistura a murmúrios, e gemidos. 

Parou de chover. A manhã avança, nublada. Creio que as chuvas, nesta época do ano, ocorrem porque frentes frias vindas da Antarctica alcançam o Planalto Central, onde encontram o chão em chamas, se condensam e caem. A manhã, então, escoa como um rio de planície, lento, rumo a outro rio, ou ao mar. Sei que o dia seguirá assim, até que as luzes da noite cintilem como pinceladas de Van Gogh. 

Meu amigo Fernando Canto aniversaria no outono. Acredito que as grandes amizades já existam antes mesmo que as pessoas se conheçam. Um dos momentos mais importantes da nossa amizade ocorreu certa noite, em Belém. Eu sentia vaga melancolia e deslizava lentamente para aquela região vazia, pegajosa, negra e sem fundo, da alma, quando surgiu o Fernando Canto. Não precisei lhe dizer nada. Ele me levou para o bar do seu tio, que nos recebeu como príncipes e nos serviu gim-tônica inglês, e logo montei no dorso de uma libélula. 

Desconfio que o Fernando Canto seja um dos anjos destacados para cuidar de mim. Temos a mesma idade, mas, nessas décadas todas do nosso convívio ele é sempre mais sensato e me corrige para que eu não caia da sela do Leão de Asas que cavalgo e que voa na velocidade da luz. Sempre que nos encontramos, mergulhamos na dimensão da intensidade, de modo que, mesmo à distância, é como se nos encontrássemos todos os dias. 

Amigos, e amigas, são criaturas maravilhosas; vão nos buscar no fundo do rio, quando já não respiramos e vemos, perto, o Aqueronte. Desde sempre, vivo cercado de anjos. Às vezes, cenas do passado passam céleres, como em um filme, por mim, e vejo que, há muito tempo, eu já deveria ter virado pó, mas sempre ouvi o farfalhar de asas e senti que alguém me erguia da vertigem que antecede a perda dos sentidos, e sei de pronto que ainda preciso cumprir minha tarefa, neste plano, e só então me integrar na luz.

A vida é a própria luz; só temos que nos deixar seguir como a brisa, igual esta manhã, que vai se esvaindo, lentamente, como o pulsar da música de Mozart. Amar é o melhor de tudo; é como ouvir a brisa, os passarinhos, o riso das crianças, o sussurro da mulher amada, as rosas, o timbre do éter.

quarta-feira, 20 de março de 2024

Mediunidade na Acupuntura

Ray Cunha e parte da equipe do Ceal (foto de 2018)

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 20 DE MARÇO DE 2024 – No Ocidente, a Medicina Tradicional Chinesa (MTC) se tornou mais uma terapia da Medicina Alopática, que trata dos órgãos humanos do ponto de vista do funcionamento deles. Na China, para os orientais, a MTC continua sendo uma realidade metafísica. Assim, é comum acupunturistas tratarem apenas sintomas, em vez de intuírem as causas. 

Por exemplo: tira-se dor de ciático, ou da região lombar, ou da região sacral, ou da cabeça, sem sequer cogitar-se o que está causando a dor. O paciente sente-se aliviado, mas, horas depois, ou dias depois, tudo volta a ser como dantes no quartel de Abrantes. 

Integrante da equipe de voluntários do Ambulatório Fernando Hessem, no Centro Comunitário da Candangolândia, coordenado pelo professor Ricardo André, atendemos em torno de 40 pacientes, aos domingos de manhã, utilizando técnicas de Medicina Tradicional Chinesa. Mas pode acontecer de o número de pacientes duplicar e a equipe reduzir-se. 

Aí, ocorre o que eu chamo de “linha de montagem”, que é quando vamos diretamente ao que mais incomoda o paciente naquele momento e utilizamos um protocolo para eliminar a dor aguda que ele está sentindo. Mas mesmo em “linha de montagem” dá tempo para intuir o que está causando aquela dor. 

Tratar só o sintoma é como sentir dor de cabeça, tomar um Anador e a dor ir para o espaço. Mas hora depois a dor está de volta. Vamos supor que a dor seja causada por um fígado castigado por falta de água, ou por alimentação energeticamente incorreta. Podemos, em um ou dois minutos, orientar o paciente e então ele resolverá totalmente o problema. 

Às 9 horas, antes de começarmos a atender os pacientes, que começam a chegar bem mais cedo para pegar senha, fazemos uma oração comum. Às vezes, o Ricardo pede para eu fazer a oração. Repito sempre a mesma ladainha: Em nome de todos, agradeço aos pacientes que vierem aqui, hoje, a oportunidade que estão nos dando de nos exercitarmos no amor; agradeço também aos nossos mentores espirituais, que nos acompanham neste trabalho, contribuindo para que utilizemos os protocolos certos para encerrar, ou diminuir, o sofrimento dos nossos irmãos. Muito obrigado! 

Também integro a equipe de terapeutas em Medicina Tradicional Chinesa que atende nas manhãs de domingo no Centro Espírita André Luiz (Ceal), no Guará I, sob a coordenação do professor José Marcelo. Lá, costumamos atender médiuns do próprio Ceal, e dois deles já viram que sou acompanhado, durante meu trabalho, por um espírito. 

Pacientes também já sentiram a presença de um espírito que me acompanha e me orienta durante o atendimento. Quanto a mim, às vezes me surpreendo com protocolos que utilizo que não foram pensados, com resposta eficiente. É a essa intuição que me refiro. 

Mas como desenvolver a intuição? Todos nós somos médiuns, é claro, pois somos espírito, e médium quer dizer “ponte” entre os planos material e espiritual. Só que algumas pessoas são tão materialistas, tão densas, que essa ponte está intransponível. 

No Brasil, temos a Associação Médico-Espírita do Brasil (AME-Brasil), assim como temos associações médico-espíritas em vários estados brasileiros. Por que isso? Porque há médicos, e muitos, que acreditam na existência do espírito. Há inúmeros relatos de médicos videntes que trabalham em hospitais que cruzam com espíritos trabalhando entre eles. 

O astrofísico e médium vidente Laércio Fonseca comenta que o médium Zé Arigó, que realizou milhões de cirurgias espirituais, era só o instrumento para o espírito Dr. Fritz, este sim, é quem realizava as curas, trabalhando com uma equipe espiritual e com tecnologia à frente milhões de anos da nossa medicina atual. Somos como Zé Arigó quando realizamos trabalho voluntário, apenas instrumentos dos nossos mentores espirituais.

Para que o plano espiritual possa descer até a matéria densa é necessário que nos espiritualizemos, isto é, oremos, realizemos atividades em prol do próximo movidos pelo amor, não desejemos mal ao próximo, não reclamemos, nem lamentemos, e agradeçamos a tudo e a todos, seja lá o que for, pois o sentimento de gratidão gera amor, paz, alegria, saúde, prosperidade. É esse o ambiente em que a intuição transita.

domingo, 17 de março de 2024

Rio de Janeiro, a Capital do Trópico

Dois ícones do Rio: Cristo Redentor e Pão de Açúcar
(Foto: Marcos de Paula/Prefeitura do Rio de Janeiro)

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 17 DE MARÇO DE 2024 – A ideia de se construir a capital do Brasil no sertão surgiu em Portugal, em meados do século XVIII. Os portugueses só pensavam em ouro. Em 1891, a primeira Constituição da República fixou a região onde deveria ser instalada a futura capital, e, em 1956, o mineiro Juscelino Kubitschek resolveu construir Brasília, inaugurando-a, ainda um parque de obras, em 21 de abril de 1960. 

Eleito, Juscelino viu, claramente, que no Rio de Janeiro jamais chegaria ao fim do seu mandato, razão pela qual resolveu governar na ponte aérea que criou, Rio-Brasília, um naco do cerrado do estado de Goiás, onde a nova capital seria erguida. Foi bom para o estafe do presidente, com gordas diárias e mordomias, durante a construção da nova capital. Na época, a inflação desembestou. 

O mandato de JK, que começou em 31 de janeiro de 1956, terminou em 31 de janeiro de 1961. Foi sucedido, em 31 de janeiro de 1961, pelo paulista Jânio Quadros, que só aguentou morar em Brasília até 25 de agosto. Caiu fora. Foi tomar seu uísque em São Paulo. Tomou posse o vice, o gaúcho João Goulart, em 8 de setembro de 1961. Comunista, Goulart foi defenestrado em 1 de abril de 1964 pelos generais, que gostaram de Brasília e ficaram no poder até 1985. 

Os generais gostaram de Brasília porque na cidade não havia a menor possibilidade de protesto popular, como no Rio de Janeiro, e assim a cidade prosperou. Hoje, mesmo com mais de 3 milhões de habitantes, a situação continua a mesma, pois a cidade foi construída de modo que qualquer manifestação popular pode ser cercada facilmente e manifestantes se arriscam a passar o resto de suas vidas, se forem preferenciais, na Papuda, a penitenciária local. 

Mas o Rio continua sendo, de fato, a capital do Brasil. Por exemplo: há 32,3 mil funcionários públicos federais no Rio a mais do que em Brasília. De acordo com o Boletim Estatístico de Pessoal, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, o Rio tem 102,6 mil servidores federais contra 70,3 mil em Brasília. Também o patrimônio das estatais federais e a presença das Forças Armadas no Rio são hegemônicos. 

Há vários fatores que obrigam a que o Rio se some a Brasília. Quantos países têm mais de uma capital! A África do Sul, por exemplo, tem três: Pretória, Cidade do Cabo e Bloemfontein. Um desses fatores é a volta do Congresso Nacional para o Rio. Lá, o Congresso virará realmente a casa do povo. 

Outro fator é que o Rio é a cidade que melhor reflete a identidade brasileira. Começou com as aldeias tupinambás cercando toda a Baía de Guanabara, os franceses da França Artártica, expulsos pelos portugueses, a chegada dos africanos, o ouro de Minas Gerais, o Império do Brasil, o golpe da República e o século XX, quando os cariocas realizaram a Semana de Arte Moderna em São Paulo, que é onde estava então o dinheiro, e os nordestinos instituíram na Cidade Maravilhosa a moderna imprensa brasileira, hoje, velha imprensa, mas porque se transformou em balcões de negociatas. 

O Rio, desde sempre, se tornou a Meca dos intelectuais e artistas brasileiros. É lá que todo mundo que vive em torno da arte e da cultura, do Sul à Amazônia, se encontra. Também o Rio é a cidade que mais recebe turistas no Hemisfério Sul, porque é a cidade mais bonita do mundo, a Capital do Trópico, abraçada pelo Cristo Redentor no alto do Corcovado, a 800 metros de altura, tem Carnaval e suas praias são estonteantes.

E depois, sua posição geográfica é estratégica, de modo que o Brasil ganharia se o Rio recuperasse o status de segunda capital do país, o que ele já é naturalmente. E Brasília, hoje, uma pujante cidade iluminando o sertão, continuaria cumprindo seu papel de cidade administrativa e ligando, juntamente com Goiânia, o continente brasileiro no planalto.

sexta-feira, 15 de março de 2024

Ministros Marina Silva e Silvio Almeida, e o governador Helder Barbalho vão ao Marajó

A trupe estava sorridente com a chegada do desenvolvimento no
Marajó, acossada por tráfico de crianças para escravidão sexual

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 15 DE MARÇO DE 2024 – A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, e o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, foram a Curralinho, no Marajó, segunda-feira 11, após denúncias de escravidão sexual de crianças na ilha voltarem, insistentes, à internet. Os ministros levaram com a promessa de Lula de garantir desenvolvimento aos ilhéus. 

Não se sabe quando nem com que dinheiro, pois Lula já raspou a burra para presentear os congressistas com bilhões em emendas parlamentares e o país enfrenta déficit fiscal. 

Os marajoaras estão entregues à própria sorte há muito tempo e as crianças são abusadas o tempo todo. Basta Marina entrar em contato com pesquisadores da Universidade Federal do Pará, ou procurar o bispo emérito do Marajó, Dom José Luiz Azcona. Ou passar alguns dias andando por lá e acompanhando o vai-vem das crianças nas embarcações que passam por ali. Vai ver coisas de arrepiar os cabelos. 

O nome dos programas são uma beleza: Cidadania Marajó, Sanear Amazônia e Assistência Técnica e Extensão Rural do Programa Bolsa Verde. Agora, a população local, especialmente crianças e adolescentes, não será mais explorada e terá água tratada e esgoto. Seis mil famílias serão beneficiadas no arquipélago, segundo os arautos de Lula. 

“Política se faz junto com o povo. O Programa Cidadania Marajó é pensado com participação social. Nada aqui será feito sem o apoio e a participação de vocês, sem que vocês digam o que está e o que não está funcionando. Os marajoaras precisam de cidadania. É por isso que o programa se chama Cidadania Marajó. Para dar cidadania, para dar acesso à política pública, para fazer com que as pessoas do Marajó sejam parte do Brasil que a gente quer fazer” – garantiu Silvio Almeida, em nome de Lula. 

Helder Barbalho, governador do Pará, foi junto com os expedicionários federais. Ele garantiu que a região do Marajó tem sido vítima de fake news relacionadas à exploração sexual infantil. “Hoje, temos a oportunidade de assinar um acordo que está dialogando diretamente com a qualidade de vida” – cantou, e todos dançaram carimbó.

Na Amazônia, ribeirinhos, quilombolas, índios, cabocos, vivem igual a língua quando se come jambu, ou igual peixe sob o efeito de timbó: dormente. Os políticos, atuais colonizadores, fazem deles o que quiserem. O calor, os insetos, as mentiras, o tráfico, a escravidão, o estupro e a morte estão sempre rondando, como hienas. O negócio é tomar cachaça e correr.

JAMBU – A Amazônia como ela é, com tráfico de crianças e pegando fogo mais do que nunca

Dia 2 de março, RAY CUNHA autografou o romance JAMBU no templo da cozinha paraense no Rio de Janeiro, o restaurante Belém Belém Amazônia, na Avenida Elizabeth da Bélgica, na altura do Posto 6, em Copacabana, comandado pela chef Mira Jatene. Na foto 1, o escritor recebe a visita de uma das mulheres mais importantes do setor de Medicina Tradicional Chinesa no Brasil: Mariella Affonseca, física, mestra em Engenharia Nuclear e doutora em Biociências Nucleares e em Acupuntura. Ela vem realizando um trabalho incansável pela regulamentação da Acupuntura. Também na foto aparece a mãe da doutora Mariella, dona Florita. Na foto 2, a presença de Luciana Magalhães (no centro), juntamente com Hyria Moreira. Luciana é filha do músico amapaense Luiz Tadeu Magalhães. Uma dica para os cantores que querem gravar um disco só com músicas inéditas: Luiz Tadeu tem dezenas de composições inéditas em parceria com o poeta e pintor amapaense Manoel Bispo, membro da Academia Amapaense de Letras (AAL). Quanto ao livro JAMBU, trata-se de um romance-reportagem, um thriller policial, a investigação de um traficante de crianças para escravidão sexual, durante o Festival de Gastronomia do Pará e Amapá. Como pano de fundo, a Questão Amazônia é esmiuçada. O livro faz uma homenagem a dois artistas amapaenses: o poeta Isnard Brandão Lima Filho e o pintor Olivar Cunha. Também em JAMBU personagens de ficção se cruzam com pessoas reais, vivas ou mortas. RAY CUNHA é natural de Macapá/AP e trabalhou como repórter, redator e editor nos maiores jornais da Amazônia, sediados em Belém, Manaus e Rio Branco.


Ruy Castro, o mais carioca dos cariocas, gosta da maniçoba do Belém Belém Amazônia, no Posto 6

Ray Cunha e a chef Mira Jatene, que comanda o Belém Belém Amazônia

RAY CUNHA

BRASÍLIA, 15 DE MARÇO DE 2024 – Estive recentemente no Rio de Janeiro para checar vários endereços e aspectos arquitetônicos para meu novo romance, que se passa na Cidade Maravilhosa. Hospedei-me em uma Airbnb na Rua Pompeu Loureiro, logo na saída do túnel Major Vaz, em Copacabana. 

No dia 2 de março, autografei o romance JAMBU no restaurante Belém Belém Amazônia, na Avenida Elizabeth da Bélgica, na altura do Posto 6, em Copacabana. A chef, Mira Jatene, me confidenciou que o escritor Ruy Castro, o mais carioca dos cariocas, gosta de maniçoba, e pede para levarem a iguaria das iguarias paraense ao seu apartamento, no Leblon.

Estiveram presentes minhas amigas Luciana Magalhães, filha do músico amapaense Luiz Tadeu Magalhães, e Mariella Affonseca, física, mestra em Engenharia Nuclear e doutora em Biociências Nucleares e em Acupuntura. Aguardei meu amigo carioca Luiz Loyola, mas não foi desta vez que nos reencontramos.

Deixei um exemplar de JAMBU para quando Ruy Castro pedir maniçoba a Mira enviar para ele. JAMBU é um romance-reportagem. A parte ficcional desenvolve-se durante o fictício Festival de Gastronomia do Pará e Amapá, um desfile dos principais pratos da cozinha paraense. 

Nesse meio tempo, o jornalista João do Bailique escreve uma edição especial da revista Trópico Úmido sobre a Questão Amazônica, enquanto investiga um traficante de crianças e de grude de gurijuba. Personagens de ficção misturam-se a personagens reais, vivos ou mortos, como, por exemplo, o poeta Isnard Brandão Lima Filho e o pintor Olivar Cunha, de Macapá/AP, e a cantora lírica Carmen Monarcha, de Belém. Como pano de fundo, a Amazônia é exibida nuinha, como ela é. 

Morei na Rua República do Peru, em Copacabana, meio século atrás. Copacabana continua tão linda quanto sempre foi. Agora, com mais moradores de rua e a praia mais lotada. O trânsito está melhor, depois que construíram o metrô, que vai até a Barra. 

Visitei o túmulo de Estácio de Sá e o marco de inauguração do Rio de Janeiro, datado de 1 de março de 1565, no Morro Cara de Cão. Ambos estão guardados na Basílica Santuário de São Sebastião, a Igreja dos Capuchinhos, na Tijuca. Visitei também a Ladeira da Misericórdia, que restou do Morro do Castelo; a Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé, ou, simplesmente, Antiga Sé; a Igreja da Candelária; e a Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, onde se desenrolou a batalha decisiva de Estácio de Sá contra os franceses da França Antártica, na qual Estácio levou uma flechada em um olho e morreu um mês depois. 

Esse Rio antigo está vivo nas páginas de O Rio antes do Rio e Arariboia: O indígena que mudou a história do Brasil – Uma biografia, de Rafael Freitas da Silva. 

Visitei ainda a Igreja de Nossa Senhora de Copacabana e Santa Rosa de Lima, na Rua Hilário de Gouveia, onde se encontra a imagem da Santa que dá nome ao bairro. 

Estive no Bairro Peixoto, onde mora o detetive Espinosa, na Praça Edmundo Bittencourt, e o segui até a 12ª Delegacia de Polícia, na Rua Hilário de Gouveia. Espinosa é o mais famoso detetive brasileiro, criado por Luiz Alfredo Garcia-Roza. 

Passei pelo Beco da Fome e no Bunda de Fora, e dei um pulo no Forte de Copacabana, onde tomei uma água tônica na Confeitaria Colombo, apreciando o recorte da praia, até o Leme, e, lá atrás, o Pão de Açúcar. 

Voltando a Ruy Castro, depois que li, dele, Metrópole à beira-mar: O Rio moderno dos anos 20, passei a ver o Rio por outra lente. Passei a vê-lo como o principal palco da história do Brasil, como vitrine cultural do país, inclusive responsável pela Semana de Arte Moderna.

De modo que o Rio continua sendo o Rio, a eterna, e, de fato, capital do Brasil, onde os rumos do país são decididos, tanto nos tempo de democracia quanto de ditadura. O Rio toma a decisão e São Paulo apoia, como foi na Semana de Arte Moderna e é na cessão da Avenida Paulista nos momentos extremos.